Governo amplia alcance do Vale-Cultura

O governo ampliou o alcance do Vale-Cultura, benefício mensal de R$ 50 para a aquisição de bens culturais por parte de trabalhadores que recebam até cinco salários mínimos.

Agora, todas as empresas poderão oferecer a seus funcionários o vale, uma das principais bandeiras da gestão Marta Suplicy no Ministério da Cultura (MinC), com entrada em vigor inicialmente prometida para o fim deste semestre e agora programada para agosto. A alteração faz parte de uma medida provisória publicada ontem, no Diário Oficial da União.

Celebrada por produtores culturais, a norma já enfrenta resistência nas entidades que reúnem micro e pequenos empresários, categorias que não terão incentivo fiscal para entrar no programa –ao contrário das empresas de lucro real. Sem essa dedução, elas deixam de ter estímulo real para aderir à iniciativa (às duas classes, o MinC propõe apenas que os R$ 50 do vale não sejam tributados).

Já o modelo desenhado para os chamados estabelecimentos de lucro real é mais generoso: eles podem destinar ao Vale-Cultura até 1% do Imposto de Renda devido. A isenção fiscal (ou seja, o governo) financia R$ 45 do benefício, e os R$ 5 restantes ficam a cargo do trabalhador ou da empresa.

“Não vai pegar”, decreta Ercílio Santinoni, presidente da Confederação Nacional das Micro e Pequenas Empresas e dos Empreendedores Individuais (Conampe). “O pequeno empresário já vive todo atrapalhado. E o programa não tem vantagem nenhuma para nós, simplesmente aumentará a nossa despesa. Se não for obrigatório, ninguém vai aderir.”

“Acho a ideia do Vale-Cultura interessante, mas, desta forma, será apenas mais um custo para a microempresa, ou seja, é péssimo, porque nós já somos os que mais pagam tributos”, avalia José Tarcísio, presidente da Confederação Nacional das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Comicro).

Apenas trabalhadores de empresas que aderirem ao programa terão acesso ao benefício. “Por isso, esse é um tema que já está entrando nas negociações coletivas de entidades trabalhistas”, afirma Marta Suplicy.

FAZENDA E MINC

Um acordo entre os ministérios da Cultura e da Fazenda inseriu no Vale-Cultura empresas de lucro presumido –que faturam menos de R$ 45 milhões por ano– e aquelas que integram o Simples (Sistema Integrado de Imposto e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte). Até a publicação da medida provisória de ontem, só empresas de lucro real estavam no radar do programa.

A inclusão das duas novas categorias alarga o escopo do Vale-Cultura -de 18,8 milhões para 42 milhões de beneficiários em potencial, segundo cálculos do MinC. Com isso, a projeção do montante injetado na economia pelo programa também foi encorpada, passando de cerca de R$ 7 bilhões para R$ 25 bilhões anuais.

O incentivo fiscal do Vale-Cultura não vai competir com os recursos da Lei Rouanet, estipulados em R$ 1,7 bilhão para 2013. “Não vamos concorrer nem com ela, nem com a Lei do Audiovisual ou a do Esporte”, explica a ministra, listando outros modelos de uso de verbas incentivadas.

MAIOR DO QUE A ROUANET

Para o diretor do Instituto Itaú Cultural, Eduardo Saron, a previsão de recursos para programa é expressiva. “Mesmo que apenas 10% se cumpra [R$ 2 bilhões dos R$ 25 bi divulgados], será muito mais do que o sistema recebe via Lei Rouanet.”

Para evitar fraudes, como o uso do vale na compra de sabão em pó ou chocolate, estabelecimentos como supermercados e lojas de departamento não serão credenciados pelo programa. O cadastro terá apenas empresas estritamente culturais, como livrarias, teatros, cinemas, lojas de música etc.

“A exceção serão as bancas de jornais, porque têm grande capilaridade no território brasileiro, apesar de haver o risco de fraude”, reconhece Henilton Menezes, secretário de Fomento e Incentivo à Cultura do MinC.

Além de ingressos para shows, peças, filmes e museus, o Vale-Cultura permitirá ao trabalhador adquirir instrumentos musicais, livros em papel e digitais, CDs e arquivos de mp3, DVDs e revistas, em lojas físicas ou via internet –uma maneira de contornar a escassez de estabelecimentos culturais fora das capitais brasileiras, conforme ilustra o quadro acima.

De acordo com um estudo da Fundação Perseu Abramo, 91% dos municípios brasileiros não têm cinema, 79% não possuem teatros ou salas de espetáculo, 70% não contam com centros culturais e apenas 28% dispõem de ao menos uma livraria.